quarta-feira, maio 4

UM CADÁVER NA COZINHA - CAPÍTULO 18


O INTERROGATÓRIO

             — Então você confirma que a faca é sua?
              Em cima da mesa, dentro de um saco plástico transparente, repousava a faca com cabo de madeira entalhada.
             — Sim, já disse! Era minha faca de pesca… — Durval estendeu a mão na direção da faca, mas o delegado Moreira a afastou.
             — Não sei como ela foi parar com o Botelho — continuou Durval. — Faz tempo que não vou pescar. Ainda mais agora, todo quebrado — apontou para o gesso na perna.
              Durval olhou bem fundo nos olhos de Moreira:
             — Parece que você não vai acreditar em mim, não é?
             — É você que está dizendo isso.
             — Será possível que você acha eu sou o assassino? Justamente eu, a única pessoa que desde o início disse que havia um cadáver nessa história? Nem nisso você acreditou.
              Durval sentiu o sangue ferver dentro do rosto. Apertou os punhos com força e ficou na ponta da cadeira enquanto falava com a voz cada vez mais rouca de raiva.
             — Se eu fosse o assassino porque diabos estaria investigando? Por que teriam me empurrado do alto de um precipício dentro do meu próprio carro? O que eu estaria…
              Faltou-lhe o ar. Começou a tossir e pigarrear. Queria continuar a falar, esbravejar. Não suportava a ideia de desconfiarem dele. De duvidarem de sua idoneidade, de sua honestidade. Pior ainda, acharem que ele teria sangue frio para matar uma pessoa. Aquilo era absurdo! E onde estava Dolores?
             — Onde está a minha esposa?
             — Na outra sala.
             — Quero vê-la imediatamente!
              Moreira levantou-se da cadeira e saiu pela porta.
              Durval tentou recuperar o fôlego. Abaixou a cabeça e respirou fundo, apertou os olhos. Talvez fossem precisar de um advogado.
              Em menos de um minuto a porta abriu-se e Dolores entrou.
             — Durval! Meu bem! O que eles fizeram com voce?
             — Nada, Dodô. Estou bem. E voce?
              Dolores olhou para o delegado que estava em pé. Durval viu faíscas sairem dos olhos de sua mulher.
             — Delegado, vou agora com o meu marido para nossa casa! Se tiver mais perguntas terá que nos prender.
              Dolores começou a ajudar Durval a levantar-se.
              O delegado ficou olhando enquanto o casal caminhou pelo corredor da delegacia indo até a porta da frente.
              Durval ficou parado na porta enquanto Dolores foi até a calçada à procura de um táxi. Ele sentiu orgulho da mulher. Queria abraçá-la agora mesmo, dizer que a amava e que ela tinha sido magnífica ao confrontar o delegado daquela forma.
              Havia começado a garoar quando Dolores conseguiu fazer um táxi parar. Ela voltou até a porta da delegacia e ajudou Durval a caminhar com a bengala até a calçada e entrar no táxi.
              Durante a trajeto até a casa, os dois ficaram de mãos dadas no banco de trás. Não falaram uma palavra. Durval estava exausto.
              E então Durval sentiu um frio na espinha quando se lembrou do dia em que havia usado aquela faca com cabo de madeira pela última vez. Lembrou-se claramente da pescaria que fizera na represa de Santa Tereza. Botelho estava com ele e havia pedido a faca emprestada. O professor nunca mais a devolvera.


CONTINUA...


Um Cadáver na Cozinha é um folhetim escrito por José Gaspar e publicado na coluna "Histórias de Mistério" do jornal The Brazilians em Nova York.

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